VIDA SÚBITA|JOELMA TORRES

Quero dar-te o que tenho de mais valioso; o meu coração, que por tanto tempo “encaixotei” por medo de quebrar e não ter mais conserto. Hoje já não alimento falsas expectativas com relação ao outro ou a pessoa que sou.
Quero entregar-me de coração a tudo que faço, aos momentos, às pessoas, às vivências… livre de medos! Conheço Aquele que me guarda! Não quero mais arrancar das suas mãos o que a Ele pertence. A minha alma corre despida, já não temo “que o meu coração se quebre”. Descobri que quebrar o coração, quando esse se tornara de pedra, tem lá as suas vantagens; vida súbita!

A reconstrução é sempre feita de carne. Carne que pulsa, sangue que escorre sobre a ferramenta cruzada do marceneiro. Estou livre, apresento-me sem máscaras, reciclando imperfeições. Sou como uma casa antiga, com algumas paredes rachadas, janelas quebradas, goteiras e defeitos… Mas sabe de uma coisa? Estou de pé, viva, forte, apropriada do meu eu verdadeiro, resistente as chuvas, ventos fortes, tempestades… Exposta aos raios de sol, que vem e iluminam os cantos mais escuros do meu interior, refletindo luz para toda a paisagem ao meu redor, deliciando-me  com às gotas do orvalho que florescem o meu jardim. Meu alicerce é forte, construído em cima da “Pedra Angular”, minha beleza é exatamente o que antes era feio. Uma beleza reluzente para os olhos dos que enxergam almas. Imperfeita, porém, perfeita, arte contraditória do criador.

Hoje abraço-me com todo gosto, abraço tudo que sou, as minhas dores, as minhas vitórias. Sou livre! Capaz de atos de amor, porém, com toda a minha humanidade, ainda também capaz de reações que causam dor. Descobri nessa longa caminhada, onde vários eram os meus ídolos, que um deles se sobressaia, um ídolo chamado “eu”. Como um “ídolo que se preza”, esse não podia errar, nem ter defeitos, não podia ser humano. Ufa! Como foi difícil viver para sustentar esse ídolo, “o” carregando por quilômetros de vida, numa procissão que durou quase todo a minha história, alimentando sobre ele expectativas irreais! Buscando atingir o inatingível, a perfeição no imperfeito. Engraçado; como tudo agora me parece tão claro. A vida é clique! Um clique na hora certa! E tudo que parecia tão definitivo, já não tem razão de ser. Aquele caminho feito e refeito várias vezes, já não me apresenta motivos para voltar. A fila andou… ela sempre anda… loucura é pensar que existe algo sem conserto. Quando penso assim, empobreço a obra-prima do Criador e corro risco de viver na escassez, dentro da caverna, isolada com os meus tesouros. Agora sei que não existe o fim, nem o ponto final. Quando as cortinas do teatro se fecham um novo espetáculo recomeça.

Enxergar além das cortinas é rasgar o véu e voar livre no céu de possibilidades.

Por Joelma Torres